Prepare-se para atender a diversidade no mercado imobiliário

O que você pensa quando ouve falar em ‘diversidade’? Palavra cada vez mais recorrente pelas transformações sociais que vivenciamos, quase sempre o termo vem acompanhado com a ideia de diferentes vivências, orientações sexuais, etnias e faixas etárias convivendo em ambientes compartilhados, certo?

Apesar do debate cada vez mais frequente, nem sempre o público LGBTQIA+ recebe a atenção devida do mercado imobiliário, uma mudança que envolve desde o projeto dos empreendimentos, até nos atendimentos dos prestadores de serviços e práticas de boa vizinhança. 

Por que abraçar a diversidade?

A recente Pesquisa Nacional Por Amostra da População LGBTI+ da TODXS indica uma realidade óbvia, mas importante: “LGBTQIA+ estão presentes em todos os estados do país”, sendo que a maioria deles residem no Sudeste (42,68%), seguido pela região Nordeste (24,91%) e do Centro-Oeste (13,45%). 

No Brasil, 2,9 milhões de pessoas acima de 18 anos se declaram como lésbicas, gays ou bissexuais, de acordo com a 
Pesquisa Nacional de Saúde (PNS): Orientação sexual autoidentificada da população adulta’ do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O próprio instituto, porém, orienta que os números podem ser subnotificados, uma vez que muitas pessoas ainda não se sentem seguras de declarar a própria orientação sexual. 

Para o mercado, há alguns diferenciais dessa parcela da população: 78% dos homossexuais têm cartão de crédito e gastam até 30% a mais em bens de consumo (Abrat-GLS). A pesquisa da TODXS também indica que 37,56% dos entrevistados estão cursando ensino universitário, média superior à população em geral, explicada na pesquisa por esse grupo não ter filhos precocemente e a percepção dos estudos como uma maneira de driblar as adversidades sociais.

Grande parte dos entrevistados (49,51%) moram em um imóvel próprio já quitado (seja da própria pessoa, algum parente ou cônjuge), 8,75% vivem em um imóvel financiado. Quem mora em uma residência alugada totaliza 40,69%. Quanto à nupcialidade, 89,19% das pessoas encontram-se solteiras, 8,83% estão casados, 1,27% estão divorciados e apenas 0,12% viúvas. Dos entrevistados, 95,71% não têm filhos, mas dos 4,29% que têm dependentes, 50,84% vivem em companhia de cônjuge ou companheira (o). 

Como os projetos imobiliários podem promover mais diversidade?

Tradicionalmente nas grandes cidades é comum encontrar ‘bolhas’ em que a população LGBTQIA+ se concentra, seja pelo acesso à atividades sociais ou estabelecimentos ‘gay friendly’, onde podem se expressar sem o receio de discriminação.

Em entrevista à Casa Vogue, a arquiteta Danielle Klinotwt reflete justamente sobre essa dificuldade urbana de romper o medo e explorar locais fora das bolhas. “Na maior parte da cidade, os espaços públicos não são acolhedores e os LGBTs não se sentem seguros. Isso é uma violação muito grande do direito à cidade, porque essa população não consegue exercer sua vivência, sua cultura”, diz Klinotwt.

Assim, desde a elaboração dos projetos imobiliários, é importante valorizar a diversidade, com pequenas adaptações, como áreas abertas, amplas e bem iluminadas para convivência, com segurança entre os frequentadores, ou sanitários unissex particulares, que podem ser acessados sem a distinção de gênero, por exemplo. A proposta para a abraçar a diversidade, portanto, não são espaços exclusivos (como centros comunitários ou memoriais) ou estereotipados (como bares, salões e baladas), mas espaços conjuntos que possam abrigar em segurança diferentes vivências. 

Você está preparado para atender as novas famílias?

Com as informações da Pesquisa Nacional Por Amostra da População LGBTI+ podemos concluir que os LGBTIQA+ buscam imóveis, têm poder de consumo e são um público mais escolarizado que o geral, o que significa, por sua vez, um cliente ainda mais exigente, criativo e sensível. 

Para o atendimento conectado à diversidade, é essencial que todos os profissionais envolvidos no mercado imobiliário, entre corretores, arquitetos, engenheiros, síndicos, porteiros, publicitários e empresários atualizem o glossário e derrubem conceitos ultrapassados.

Uma mudança que começa com uma simples troca de termos: ao atender um casal homossexual, adote o sinônimo ‘casal homoafetivo’. Um pequeno ajuste que já ressalta a conexão emocional e carinho entre as pessoas, independente do gênero. Ao invés do generalista ‘gay’, insira os termos adequados para homossexual, bissexual ou transgênero e, claro, só aborde o tema da orientação sexual dos clientes quando houver abertura. Não tenha receio de perguntar aos clientes como eles querem ser tratados. 

Casais homoafetivos e as famílias formadas por eles também são amparados pela lei: desde 2011, a união estável foi aprovada pelo Supremo Tribunal Federal e a adoção por LGBTQIA+ é juridicamente possível no Brasil desde 2013, que formalizou a família homoafetiva no ordenamento jurídico brasileiro. 

Convivendo com a diversidade: opinião ou homofobia?

Não é possível ainda falar dos avanços da diversidade sem ressaltar os problemas enfrentados por muitos LGBTQIA+ na vivência com a vizinhança em residenciais fechados e condomínios, o que exige também um alerta para os síndicos, porteiros e seguranças.

Ainda há pessoas que associam os LGBTQIA+ com um comportamento de risco, uma vivência clandestina, o que colocaria em risco o bem-estar dos demais moradores. Clichês e preconceitos que, infelizmente, geram atos de intolerância e violência em diversas regiões brasileiras, como um casal gay impedido de alugar o imóvel no Rio de Janeiro, outro casal agredido por uma vizinha na Bahia, o casal que recebeu um bilhete ameaçador em Joinville por andar de mãos dadas, um homossexual atacado por vizinhos em Manaus, um casal em Curitiba que recebeu ameaças de vizinhos, outro casal que precisou se mudar em BH ao ser agredido por um PM ou um casal de lésbicas que foram intimadas para sair em 48h de casa na Bahia.  

Infelizmente não é exagero temer pela segurança mesmo perto de casa, uma vez que o Brasil é um dos países com o maior índice de homicídios por homofobia no mundo: 320 pessoas LGBTQIA+ morreram por causas violentas no país em 2021, como indica o levantamento “Observatório de Mortes e Violências contra LGBTI+“.

Nesse sentido, é importante que casos de homofobia por prestadores de serviços ou vizinhos nos empreendimentos imobiliários não sejam mais atenuados, mas denunciados. Homofobia não é opinião, mas um crime e não há desculpas geracionais ou religiosas para a manutenção dessa situação no convívio social. Desde 2019, o Supremo Tribunal Federal (STF) incluiu que a discriminação por identidade de gênero ou orientação sexual é crime, com pena que inclui multa e reclusão, de 1 a 5 anos.

Abraçar a diversidade é um compromisso geral

É preciso uma mobilização geral, que vá além de campanhas publicitárias ou eventos festivos, restritos anualmente às últimas semanas de junho. No mercado imobiliário, abraçar a diversidade pode vir no treinamento dos profissionais, palestras e eventos que ensinem diferentes prestadores de serviços como atender aos desejos dos LGBTQIA+, com mais naturalidade e empatia.

Para os projetos imobiliários, fica uma grande oportunidade de quebrar clichês e bolhas, com projetos que abraçam e protegem todas vivências, com áreas verdes, espaços comerciais e espaços de lazer que promovam uma vivência plena, independente da orientação sexual.

Muito além de uma decoração com as cores de arco-íris, é importante que o mercado imobiliário esteja atento a uma realidade que não vai mudar: o público LGBTQIA+ saiu do armário e quer viver bem, com proteção, lazer e qualidade de vida.

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